Por 10 votos a 1, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta
quarta-feira (27) que a vaga decorrente do licenciamento de titulares de
mandato parlamentar deve ser ocupada pelos suplentes das coligações, e
não dos partidos. A partir de agora, o entendimento poderá ser aplicado
pelos ministros individualmente, sem necessidade de os processos sobre a
matéria serem levados ao Plenário.
Durante mais de cinco horas, os ministros analisaram Mandados de
Segurança (MS 30260 e 30272) em que suplentes de deputados federais dos
estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais reivindicavam a precedência
na ocupação de vagas deixadas por titulares de seus partidos, que
assumiram cargos de secretarias de Estado.
A ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, relatora dos processos, foi a
primeira a afirmar que, se o quociente eleitoral para o preenchimento de
vagas é definido em função da coligação, a mesma regra deve ser seguida
para a sucessão dos suplentes. “Isso porque estes formam a única lista
de votação que em ordem decrescente representa a vontade do eleitorado”,
disse.
Além da ministra Cármen Lúcia, votaram dessa forma os ministros
Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Ayres
Britto, Gilmar Mendes, Ellen Gracie, Celso de Mello e Cezar Peluso.
Somente o ministro Marco Aurélio manteve a posição externada em
dezembro do ano passado, no julgamento de liminar no MS 29988, e
reafirmou que eventuais vagas abertas pelo licenciamento de
parlamentares titulares devem ser destinadas ao partido.
Mais votado
“Deverá ser empossado no cargo eletivo, como suplente, o candidato
mais votado na lista da coligação, e não do partido que pertence o
parlamentar afastado”, afirmou o ministro Luiz Fux, que se pronunciou
logo após a relatora dos processos.
Segundo ele, a coligação regularmente constituída substitui os
partidos políticos e merece o mesmo tratamento jurídico para todos os
efeitos relativos ao processo eleitoral. Para o ministro, decidir por
uma aplicação descontextualizada da conclusão de que o mandato pertence
aos partidos, no caso, “significaria fazer tábula rasa da decisão
partidária que aprovou a formação da coligação”. Também seria negar aos
partidos políticos autonomia para adotar os critérios de escolha e
regime de coligações partidárias consagrados na Constituição Federal.
A ministra Ellen Gracie, por sua vez, afirmou que a Constituição
Federal reconhece o caráter de indispensabilidade às agremiações
partidárias, assegurando seus direitos, inclusive o de adotar regimes de
coligações eleitorais. Ela frisou que o partido pode optar por
concorrer sozinho ou reunir-se com outros para obter resultado mais
positivo.
Os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Ayres Britto
mantiveram entendimento externado em dezembro do ano passado, no sentido
de que a vaga de suplência pertence à coligação.
“O presidente da Câmara dos Deputados assim como os presidentes de
Assembleias Legislativas, de Câmara de Vereadores e da Câmara
Legislativa do Distrito Federal recebem uma lista do Poder Judiciário
Eleitoral e essa lista diz a ordem de sucessão (dos suplentes)”, afirmou
o ministro Toffoli. “Essa lista é um ato jurídico perfeito”, disse.
Lewandowski ressaltou que as coligações têm previsão constitucional e
que os partidos políticos têm absoluta autonomia para decidir sobre se
coligar. “As coligações existem, há ampla liberdade de formação das
coligações, as coligações se formam, por meio delas se estabelece o
quociente eleitoral e também se estabelece quem é o suplente que
assumirá o cargo na hipótese de vacância”, concluiu.
Ao expor seu posicionamento, o ministro Ayres Britto afirmou que a
tese da preponderância da coligação sobre o partido, no caso,
“homenageia o sumo princípio da soberania popular, manifestada na
majoritariedade do voto, sabido que os suplentes por uma coligação têm
mais votos do que os suplentes por um partido”.
O ministro Celso de Mello votou no mesmo sentido. Em decisão liminar
tomada em março, ele já havia manifestado que o cômputo dos votos
válidos para fins de definição dos candidatos deveria ter como parâmetro
a própria coligação partidária, e não a votação dada a cada um dos
partidos coligados.
Na noite desta quarta-feira, ele afirmou que, embora a coligação
tenha caráter efêmero, as consequências dos resultados por ela obtidos
têm eficácia permanente. Caso contrário, segundo o ministro, cria-se uma
situação de vício em que parlamentares menos votados assumem vagas em
lugar de outros que obtiveram votação bem mais expressiva.
Ele também afastou o argumento de que a hipótese se amolda à decisão
do STF sobre infidelidade partidária, quando a Corte firmou entendimento
que o mandato pertence ao partido, quando um parlamentar é infiel à
agremiação.
Segundo Celso de Mello, a infidelidade representa uma deslealdade
para com o partido e uma fraude para com o próprio eleitor, além de
deformar a ética e os fins visados pelo sistema de eleições
proporcionais. Nos casos hoje analisados, concluiu ele, as coligações
foram firmadas de livre e espontânea vontade pelos partidos dos
suplentes, com objetivo de obter melhores resultados eleitorais.
Nova análise
Além da ministra Cármen Lúcia, os ministros Joaquim Barbosa, Gilmar
Mendes e Cezar Peluso modificaram posição apresentada em dezembro do ano
passado e aderiram ao entendimento de que as vagas de suplência devem
ser definidas pelas coligações.
“Em caso de coligação não há mais que se falar em partido, porque o
quociente eleitoral passa a se referir à coligação”, disse o ministro
Joaquim Barbosa.
O ministro Gilmar Mendes fez severas críticas ao sistema de coligação
partidária, mas, ao final, ressaltou que a prática “ainda é
constitucional”. Para ele, as coligações são “arranjos momentâneos e
circunstanciais” que, na prática, acabam por debilitar os partidos
políticos e o sistema partidário, em prejuízo do próprio sistema
democrático.
“Em verdade, as coligações proporcionais, ao invés de funcionarem
como um genuíno mecanismo de estratégia racional dos partidos
majoritários para alcançar o quociente eleitoral, acabam transformando
os partidos de menor expressão em legendas de aluguel para os partidos
politicamente dominantes. O resultado é a proliferação dos partidos
criados, com um único objetivo eleitoreiro, de participar das coligações
em apoio aos partidos majoritários, sem qualquer ideologia marcante ou
conteúdo programático definido”, ressaltou.
Último a votar, o ministro Cezar Peluso também acompanhou o voto da
relatora. No entanto, ele ressaltou que a coligação, “tal como
estruturada hoje, é um corpo estranho no sistema eleitoral brasileiro”,
concordando com as críticas apresentadas pelo ministro Gilmar Mendes.
“A coligação, para mim, teria sentido se ela fosse desenhada como
instrumento de fixação e execução de programas de governo”, disse o
ministro Peluso. Do ponto de vista prático, ele considerou que entre as
incongruências geradas pela atual estrutura da coligação está a posse de
suplentes que tiveram “votação absolutamente insignificante e incapaz
de representar alguma coisa”. O ministro também demonstrou preocupação
quanto à eventual necessidade de se realizar novas eleições, tendo em
vista que há 29 deputados federais que têm suplentes de seus próprios
partidos.
Divergência
O ministro Marco Aurélio abriu a divergência. Segundo ele, o eleitor
não vota em coligação. A Constituição, disse, versa realmente sobre
coligação, mas com gradação maior versa sobre a instituição que é o
partido político. Segundo ele, a Constituição concede ao partido até a
possibilidade de definir com quem pretende se coligar. O ministro também
ressaltou a necessidade de preservar as bancadas e a composição dos
blocos partidários, assim como a representatividade dos partidos nos
cargos de direção da Câmara, que poderão ser alteradas com este novo
critério de convocação de suplentes.
Do site do STF
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