A
causa não é fome, guerra, vírus ou bactéria. Uma vida se perde a cada
15 minutos em acidentes de trânsito no Brasil. Olhe seu relógio e pense:
“100 brasileiros morrem a cada 24 horas em ferragens, no asfalto e na
calçada”. Por ano, são 36 mil – no cálculo mais conservador. Esses são
os mortos. Sem contar os amputados e paraplégicos. Motoristas,
passageiros, pedestres, ciclistas, motociclistas. Eu sei, você sabe. E
quem dirige carros potentes, alcoolizado e a 150 quilômetros por hora
também sabe.
Desastres
recentes, no Estado de São Paulo, envolveram gente de muita grana e na
idade mais perigosa segundo as estatísticas da violência sobre rodas:
entre 20 e 30 anos.
A
nutricionista Gabriella Guerrero Pereira, de 28 anos, perdeu o controle
do Land Rover blindado e atropelou na calçada o administrador Vítor
Gurman, de 24, na Rua Natingui, na Vila Madalena, bairro com bares e
restaurantes lotados à noite. Gabriella deu entrevista, chorou, disse
que assumiu a direção do carro “robusto mas instável” porque o namorado
estava bêbado. “A rua é muito estreita para a proporção do carro. O
acidente aconteceu”, disse ela. Gabriella não fez exame de bafômetro
“porque o PM não pediu”. O PM desmentiu. Disse que ela se recusou. Vítor
morreu dias depois do atropelamento.
O
engenheiro Marcelo Malvio Alvez de Lima, de 36 anos, dirigia um Porsche
na Rua Tabapuã, no bairro Itaim Bibi. Num cruzamento, chocou-se com o
Tucson da advogada Carolina Menezes Cintra Santos, de 28 anos. Carolina
tinha cometido um erro: ela passava o sinal vermelho lentamente, quando
foi atingida pelo Porsche de Marcelo. O engenheiro foi acusado de estar a
150 quilômetros por hora, numa rua que permite velocidade máxima de 60
quilômetros por hora. Ele nega. “Não sou bandido”, disse, em entrevista.
Tinha bebido, segundo ele, “não mais do que duas taças de vinho”. Não
gostou de ficar conhecido como o “dono do Porsche”. Sobre o desastre,
afirmou: “Aconteceu um acidente, ela faleceu, com certeza isso estava
nos planos de Deus”. Marcelo pagou R$ 300 mil de fiança. Carolina morreu
no instante da colisão.
O
administrador João Luís Raiza Filho, de 30 anos, perdeu o controle de
seu Chevrolet Camaro, subiu no canteiro de uma praça em São Bernardo do
Campo, bateu em árvores e derrubou um muro. Como estava nu da cintura
para baixo, um PM precisou emprestar a ele uma cueca para sair do carro.
No banco ao lado do motorista, havia uma garrafa vazia de uísque. Raiza
Filho já foi personagem de “Nossa Antena”. Em outubro de 2007, o
playboy, então com 27 anos, destruiu sua Ferrari na véspera do GP de
Fórmula 1 em São Paulo. Bateu sob um viaduto. Deu cabeçada na boca de um
cinegrafista. Teve de pagar R$ 3 mil pela agressão. Há quatro anos,
esta coluna dizia o seguinte: “Numa sociedade em que nossos atos têm
consequência, esse rapaz seria condenado a prestar serviços à
comunidade. Se seu castigo for apenas trocar uma Ferrari por um
Mercedes, nada mudará em sua vida”. E não mudou mesmo. Errei na marca do
novo carro.
Olhe seu relógio e pense: uma vida se perde a cada 15 minutos em acidentes de trânsito no Brasil
RUTH DE AQUINO
colunista de ÉPOCAraquino@edglobo.com.br
Enviado por: Cid Cordeiro
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